Entre a vila de Redondo e a Serra d’Ossa há muito que ver e que fazer. Deixamos aqui 7 objetos que não pode perder numa visita a este concelho alentejano que sabe receber como ninguém.
Do centro da vila, com o seu castelo medieval e o edifício da Câmara Municipal, entre Redondo e a Serra d’Ossa há muito para ver e para provar. Podíamos falar da gastronomia, mas optámos por saber dos muito premiados vinhos do concelho, e contamos também histórias a propósito do Convento de São Paulo e do único buraco da alma da Anta da Candeeira. E, numa vila que de dois em dois anos se engalana com ruas floridas, a flor de papel é o último dos 7 objetos com história entre Redondo e a Serra d’Ossa que destacamos.
1. Porta da Ravessa
Comecemos pelo início, como convém. Comecemos pelo castelo medieval mandado erigir por D. Dinis e pelo seu maior símbolo: a Porta da Ravessa.
Rui Mataloto, arqueólogo, fala-nos desta porta do castelo, que ainda hoje mantém intactas as suas caraterísticas arquitetónicas góticas, com o escudo real. Esta era a porta virada a Vila Viçosa e a nascente e, pela sua orientação geográfica, ganhou dois nomes.
“Tem a curiosidade -diz-nos – de ter duas designações. A Porta da Ravessa é também a Porta do Sol e é essa dualidade que é interessante. Ela é Porta do Sol de manhã, porque está virada a nascente, e é Porta da Ravessa pela tarde, porque Ravessa tem esse significado sombrio e escondido do sol, que só acontece da parte da tarde”.
A Porta da Ravessa tornou-se uma das imagens da própria vila quando a Adega Cooperativa de Redondo decidiu assim chamar o seu vinho mais popular.
2. A torre de menagem
A torre de menagem é muito posterior à construção do castelo. Na segunda metade do século XV, conta Rui Mataloto, a antiga torre de Alcaidaria tinha-se tornado pequena para a pujança da vila alentejana e os habitantes de Redondo fazem uma petição ao rei D. Afonso V que “concedeu essa graça ao Redondo, mas disse-lhes que sim senhor, podem fazer uma nova torre, mas não há dinheiro.”
A população volta a apelar à graça real e D. Afonso V “acabou por impor um imposto novo junto dos habitantes da cidade de Évora” para pagar a torre de menagem de Redondo. Esse imposto era sobre o consumo de vinho.
“Cada vez que se comprava vinho em Évora ter-se-ia de pagar algo mais para custear a construção da torre de menagem de Redondo”, afirma. Rui Mataloto tem um pequeno sorriso quando conta esta história porque ela tem um final que faz lembrar qualquer coisa…
“Estando a torre construída, os habitantes de Évora fizeram uma petição ao rei, então já o D. João II, apelando a que não se continuasse a pagar o imposto e, ao que parece, o monarca fez um bocadinho de orelhas moucas e lá continuou o imposto apesar de o propósito para que ele tinha sido estabelecido já estar concluído”.
3. Os vinhos de Redondo
Entre Redondo e a Serra D’Ossa não existe propriamente a planície alentejana, apesar de a vista se espraiar até Évora. Esse é um dos segredos para a qualidade dos vinhos de Redondo. Todas as grandes adegas que nasceram neste concelho têm vinhos premiados internacionalmente.
É o caso da Casa Agrícola Alexandre Relvas. O filho do fundador da adega, que junta ao nome do pai o apelido Júnior, explica em conversa com Ana Bravo para o Portugal de Lés a Lés, o que torna o Redondo tão especial no que aos vinhos diz respeito: “É um concelho fantástico para produzir vinhos!”.
Há a morfologia do solo e a exposição solar como fatores determinantes. Alexandre Relvas Júnior sublinha que “há um ponto chave que são as 3 mil horas de sol que levam as uvas a uma maturação fantástica e a produzir vinhos que podem nunca chegar a ser os melhores do mundo, mas de que o consumidor gosta, com personalidade própria”. Quer com isto dizer que “os vinhos não são feitos para ganhar prémios”. No Alentejo, a gastronomia e o vinho são “uma forma de culto”.
A diversidade de solos e as diferentes exposições solares dos terrenos entre Redondo e a Serra d’Ossa explicam essa excelência. “A planície alentejana é algo que no Redondo não existe. Tudo à volta é ondulado. Começamos pelo sopé da serra onde há solos com bastante qualidade até à zona onde estamos, que tem uns xistos muito friáveis onde as raízes conseguem crescer para dentro do xisto, o que traz uma frescura extraordinária aos vinhos, até aos solos de granito na zona do Freixo. Há muita diversidade”.
Às condições da terra, há ainda que juntar a da qualidade na feitura dos vinhos que as adegas de Redondo têm conseguido desde há já largos anos. É também por isso que hoje o concelho é uma referência na produção vínica do Alentejo.
4. O buraco da alma
Voltemos muito atrás no tempo e andemos uns quilómetros entre Redondo e a Serra d’Ossa. À entrada da Aldeia da Serra está a Anta da Candeeira. Este é um monumento megalítico único porque no esteio de cabeceira encontra-se um buraco perfeitamente circular que, no século XIX, deu muito que pensar aos arqueólogos.
José Leite de Vasconcelos, o famoso arqueólogo responsável pelos primeiros estudos sistematizados do megalitismo em Portugal, aventou a hipótese de o buraco ser uma manifestação da cosmovisão pré-histórica e chama-lhe o buraco da alma, afirmando que seria por esse buraco que as almas dos mortos partiriam.
Esta designação ganhou popularidade e ainda hoje é assim que o furo circular é conhecido, mas logo na altura um arqueólogo francês contestou a interpretação de Leite de Vasconcelos e afirmou haver indícios de que o buraco teria sido feito com recurso a instrumentos metálicos e, consequentemente, muito posterior.
Rui Mataloto seria quem viria a desvendar o mistério. “Fizemos escavações e encontrámos indícios de que o espaço teria sido utilizado e habitado nos finais do século XIII, inícios do século XIV. A melhor hipótese, cremos nós, para a utilização daquele espaço como habitação seria a sua ligação com a comunidade eremítica. Porque esta comunidade da Serra d’Ossa tinha uma particularidade que depois se veio a expandir para outras zonas, que é a de – com alguma frequência – abrirem pequenas cavidades na rocha onde praticavam retiros temporários de ascetismo”.
“Daí que esta seja a melhor explicação para a utilização da anta e para a abertura do dito buraco da alma, que não deixa de ter uma componente ideológica interessante porque não havia necessidade nenhuma para abrir aquele óculo, porque entraria claridade suficiente. Contudo, ao abri-lo, vê-se quer o pôr-do-sol quer a ligação ao próprio sítio do convento”.
5. Painel de azulejo de São Paulo Eremita
A Anta da Candeeira está situada entre Redondo e a Serra d’Ossa. Se subirmos mais um pouco, já bem lá no topo, temos o convento que o eremita queria saber por perto ao fazer o óculo no monumento megalítico.
O convento que é hoje um hotel rural alberga a mais importante coleção de azulejos do século XVIII português in situ. Nas paredes dos seus corredores estão representados todos os grandes mestres que elevaram a arte do azulejo português ao seu mais elevado nível.
Eduardo Bon de Sousa, o diretor-geral do hotel, conta-nos a história de um dos mais importantes painéis que aqui se encontram: aquele que conta a história do encontro entre São Paulo Eremita e Santo Antão.
Nestes painéis que nos falam de episódios bíblicos, escolhemos por objeto com história o que tem por protagonista o santo cujo exemplo os monges seguiam no convento.
“Santo Antão seria, em teoria o primeiro dos eremitas, mas recebe uma mensagem de Deus, que lhe diz que não está correto porque existe São Paulo, que está em isolamento no deserto de Tebaida já há muito tempo e guiou-o até São Paulo, que vivia como verdadeiro eremitagem. Não falava com ninguém, ao contrário de Santo Antão, e vivia debaixo de uma tamareira e tem um corvo que lhe traz meio pão todos os dias. No dia em que Santo Antão o encontra, o corvo manda-lhe um pão inteiro para ele saber que está perante outro santo e que deve comunicar com Santo Antão”.
6. O edifício da Câmara Municipal
Entre Redondo e Serra d’Ossa temos andado. Chegou a altura de voltarmos à vila alentejana para determos o nosso olhar para o edifício da Câmara Municipal.
Quando a vila se estende até ao Rossio, torna-se necessária a construção de um novo edifício. “Num contexto nacional de afirmação do poder real absoluto, é com D. José que se inicia a sua contrução”, conta Rui Mataloto.
O edifício de traça pombalina tem como responsável Manuel da Maia, “o brigadeiro que viria pouco depois, sob a orientação do Marquês de Pombal, a dirigir a reedificação de Lisboa” após o terramoto.
Mas o largo do Município tem outros pontos de interesse. “A calçada sai do traço de Eduardo Nery, a convite do arquiteto Formosinho Sanches, quando fez o Palácio da Justiça. E no lago há outro elemento esculturar feito por Jorge Vieira. “A par da de Lisboa, a Praça da República de Redondo é a única que junta” estes dois artistas.
7. A flor de papel
A flor de papel tem um importante significado em Redondo. De dois em dois anos, as Ruas Floridas enchem de cor a alvura da vila alentejana e atraem milhares de visitantes que ficam assim a conhecer o Redondo e a Serra d’Ossa, a mestria e a arte dos seus habitantes.
Esta é uma festa em que a expressão do sentimento de comunidade é presente, como em poucas no país. Os vizinhos das ruas que se engalanam no início de agosto, começam a preparar a decoração com perto de um ano de antecedência.
A origem da decoração remonta a meados do século XIX, mas a génese da festa vem mais de trás. O historiador e investigador José Calado descobriu um documento de 1763 em que os redondenses prometem à Virgem de ao Pé da Cruz fazer uma festa anual em sua honra se ela interceder e acabar com a grande seca que se fazia sentir na altura.
Só perto de um século depois, as flores de papel começariam a aparecer nas janelas das casas mais abastadas. As pessoas gostaram, replicaram o gesto, e nasceram assim as ruas floridas de Redondo.
“Em agosto, no Alentejo, não temos muitas flores. Nunca tivemos, com este calor abrasador. E as festas ficam mais bonitas se tiverem flores. O facto de utilizarem flores artificiais de papel e muito coloridas acaba por ser uma fuga”.
Com a história destes 7 objetos, ficamos a conhecer melhor o território entre Redondo e a Serra d’Ossa. Um concelho com muito que oferecer aos visitantes, com uma cultura forte onde o cante e as saias ainda ecoam e com uma gastronomia que, só de pensar, nos deixa a salivar.