Do cimo dos Penedos de Fajão, a vista é deslumbrante, com as montanhas vizinhas a ganharem tons de azul e cinza à medida que o Sol se vai pondo. No topo norte do concelho de Pampilhosa da Serra, a mais de 1.000 metros de altitude, este é um lugar mágico.
A nossa visita foi posterior ao incêndio de 17 de junho. Com esta série de reportagens, mos-tramos que continua a ser possível ter boas experiências na zona afetada. Fazer turismo também pode ser uma forma de solidariedade
Das aldeias do Xisto, Fajão talvez seja a mais importante, tendo sido sede de concelho até ao século XIX. Há poucos anos, um casal algarvio apaixonou-se pela aldeia de casas de pedra escuras que se espraia a partir do largo da igreja. Cláudia e António foram ficando e a paixão transformou-se em amor. Hoje, são responsáveis por muita da agitação que tomou conta da terra e que traz mais forasteiros à serra de Fajão.
Quem for até Fajão este verão verá, espalhada pelas ruas da aldeia, uma exposição de carrinhos de rolamento; quem subir até à piscina da freguesia, fruirá um espaço cuidado e um agradável “bar de praia”; quem quiser conhecer a serra ou fazer uma caminhada aquática, encontra em Fajão um parceiro e um guia.
Foi já este ano que abriu a loja de turismo da Origem Safaris, a empresa do casal que promove o turismo de natureza num cenário idílico. À janela da sua casa, D. Antónia dá-nos indicações para chegarmos à antiga cavalariça recuperada. “É aqui nesta casa, do outro lado. Se não estiver lá ninguém, estão na piscina, que são eles quem toma conta dela. São muito simpáticos…” O sorriso a falar dos vizinhos é o sinal de que esta gente serrana acolheu o casal que veio do Algarve.
Nos anos 90 do século passado, foi em Fajão que nasceu o primeiro clube de carrinhos de rolamentos do país. Os jovens de então fabricavam autênticos bólides com que desciam a serra. “Faziam corridas de dia e de noite. Punham alguém lá em baixo para não passarem carros e iam por aí fora”. Os pilotos foram envelhecendo e os carrinhos ficaram a ganhar pó no armazém, até que António Matos os descobriu. A exposição está aí pelas ruas da aldeia e mais tarde poderá chegar a primeira descida homologada para carrinhos de rolamentos.
António Matos conta a história da sua chegada à aldeia sentado no bar da piscina de Fajão. É um verdadeiro bar de praia, de decoração bem humorada e alegre, com um gira-discos e dezenas de LP de vinil à disposição do cliente. É a Origem Safaris quem toma conta do espaço nos próximos cinco anos. “Queríamos trabalhar na área da agricultura sustentável e do turismo e começámos à procura de um lugar. Quando chegámos a Fajão percebemos todo o potencial e ficámos”.
“Vão escavando…”
E o potencial é imenso. Há a montanha e o rio Ceira, os alojamentos locais e os costumes que ainda se mantêm. Subir aos Penedos de Fajão ou fazer uma caminhada aquática são experiências que se querem repetir. A equipa da Origem Safaris acompanha todos quantos queiram experimentar este território e acrescenta valor a simples passeios.
Foi assim que ficámos a saber a história da gruta que passa por baixo de uma aldeia hoje desabitada. “O rio contornava a aldeia e corria por uns campos cultiváveis. O proprietário trouxe uns mineiros que começaram a abrir o túnel para desviar o rio. Às tantas, os mineiros depararam-se com rocha dura e foram dizer ao patrão que não conseguiam continuar o túnel. Ele perguntou-lhes se não saia nada e responderam-lhe que muito pouco, ao que ele retorquiu: ‘então vão escavando que eu vou cavando’.
Os Penedos de Fajão
Lá no alto dos Penedos de Fajão, a vista é de cortar a respiração. Para lá chegarmos, António Matos leva-nos num todo-terreno que vai vencendo os desníveis com suavidade. A uns poucos quilómetros de Fajão, estamos em plena Rede Natura e aqui é o mato que predomina. A urze, o medronheiro e azinheiras que resistem aos ventos e não adquirem o volume das árvores de zonas mais baixas, pintalgam a paisagem onde penedos de xisto enformam a paisagem.
Estes penedos, ocados por cavernas, formam fortificações naturais que foram ao longo da história sendo utilizadas por vários povos. E têm nomes: Forno, Igreja dos Mouros, Penalva ou Porta da Falsidade. António Matos conta-nos a lenda por trás do nome da Porta da Falsidade.
É uma história dos tempos em que as montanhas de Pampilhosa da Serra serviam de fronteira entre mouros e cristãos. Os mouros mantinham-se nos penedos e os cristãos ocupavam já Fajão. Certa noite, no povoado, houve a ideia de colocar velas em cada uma das cabras e levar o imenso rebanho comunitário em direção aos penedos. “Quando os mouros viram aquela grande quantidade de luzes, pensaram que vinha ao seu encontro um grande exército e desataram a fugir”.
Passear por Fajão é um deslumbre para a vista e um manancial de incríveis histórias que António Matos e a equipa da Origem Safaris vão contando, tornando uma visita à aldeia do xisto e suas cercanias uma experiência que não se esquece.
Seja na xistosa zona norte ou, mais a sul, onde o Unhais que não conhece outro concelho se junta ao Zêzere formando a Ilha de Padrões, o território de Pampilhosa da Serra é todo ele um tributo à natureza e aos saberes de uma cultura que se foi forjando ao longo dos tempos.
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