Fazer turismo pode também ser uma forma de solidariedade e é-o certamente na zona do Pinhal Interior. Um mês após o incêndio de Pedrógão Grande os operadores turísticos debatem-se com um cancelamento generalizado de reservas. O centro do país não ardeu todo e mesmo na área afetada é possível ter boas experiências. Está à espera de quê?
“Este iria ser o melhor ano de sempre e de repente fiquei sem reservas nenhumas”. Domingos Luís, proprietário dos Casais do Termo, está desconsolado. O seu turismo de habitação é um ponto verde no coração de Pedrógão Grande, mas no dia a seguir ao incêndio todos os hóspedes tinham cancelado.
Elsa Marçal, a diretora do Convento da Sertã Hotel queixa-se de algo muito semelhante. “Perdemos 80 por cento das reservas e o concelho da Sertã nem sequer foi afetado pelo fogo”. O mesmo aconteceu com Pampilhosa da Serra, mas Leonor Coelho, do turismo rural Casa de Santo Antão, sofre do mesmo problema: “cancela-se se está ardido e cancela-se se ainda está verde porque ainda pode arder!”
Com esta ou aquela nuance, o retrato é igual em todo o centro do país. Logo a seguir à tragédia de 17 de junho, as pessoas cancelaram em massa as férias ou escapadinhas que tinham planeado para aquela zona. Aturdidas com os números, impressionadas com o custo em vidas humanas, houve um trauma generalizado.
Não ardeu tudo
Mas apesar de este ter sido o maior incêndio de sempre em Portugal, a imensa maioria do território do centro do país não foi afetado. E mesmo onde as chamas lavraram é possível ter boas experiências. Podemos garantir-lho porque nos últimos 15 dias andámos pela zona.
Tivemos excelentes experiências, mas não há que branquear o que se passa. É duro passar horas a conduzir entre as cinzas, sentir o cheiro omnipresente do queimado, falar com pessoas que estão traumatizadas. Mas a outra face da moeda também é verdadeira e a imensa maioria dos pontos de interesse não foram afetados. Não é, por isso, um turismo da desgraça aquilo que se propõe. É antes o ter a oportunidade de se ser solidário e ter boas experiências.
Casal de São Simão é um bom exemplo do que atrás se disse. O fogo chegou mesmo às traseiras do restaurante, mas a bela aldeia de xisto do concelho de Figueiró dos Vinhos mantém-se intacta, assim como intacto está todo o vale do Alge. Este é um destino que se aconselha. Durma-se na muito confortável Casa Amarela, gozem-se as vistas do seu terraço e parta-se à conquista do vale, sempre a descer até às Fragas de São Simão e à praia fluvial. No regresso, jante-se na Varanda do Casal. Verá que não sentirá defraudadas as suas expetativas.
De expetativas nos fala Domingos Luís. O proprietário dos Casais do Termo, em Pedrógão Grande, sabe ter sido um homem com sorte. Apesar de também atingidas, a maioria das suas terras não ardeu. “Tinha ido à Sertã ver a minha filha e no regresso já não nos deixaram passar. Ainda bem, porque senão tinha-me desgraçado”, conta no passeio em que nos levou pelo seu pinhal que ardeu.
Domingos e Olinda Luís tinham grandes planos para este verão. Iam lançar um ponto de apoio de auto-caravanas e preparavam-se para começar a construir uma piscina ecológica. A zona das caravanas ardeu e quando viram as reservas serem canceladas deixaram de poder sonhar com a piscina.
No outro dos concelhos mais atingidos, Castanheira de Pera, a grande atração é a Praia das Rocas. A maior piscina do país mesmo no centro da vila, viu o fogo do outro lado da encosta, mas não foi afetada e uma semana depois já tinha aberto ao público. Quando ali nos deslocámos, eram centenas os que aproveitavam as ondas a 80 quilómetros do mar e o ambiente era descontraído.
Depois, de Sertã a Proença-a-Nova, há um mundo por explorar no centro do país. Aqui temos as aldeias de xisto, as praias fluviais, o património edificado, museus e a gastronomia. Há muito e bom para se fazer no centro, nomeadamente na zona do Pinhal Interior.
Mas neste verão, os operadores turísticos desesperam. Perderam grande parte das reservas e os cancelamentos vieram maioritariamente de clientes portugueses.
Agora, passado o choque, há que pôr mãos à obra e continuar a ajudar quem precisa. É por isso que hoje fazer turismo no centro do país é também um acto solidário. Todos temos de contribuir para que a zona renasça das cinzas. Está à espera de quê?