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Istambul: no mais famoso souk do mundo

Uma loja colorida

O souk de Istambul é o mais famoso do mundo. Espraia-se pela colina fora a caminho do Grande Bazar, que é o seu centro nevrálgico. Quanto mais subirmos, mais entramos no mercado verdadeiro.

Aqui é fácil perdermo-nos porque o Bósforo está logo ali e serve como referência geográfica. As primeiras ruas são as mais turísticas, aquelas onde se vendem bugigangas e especiarias, a pensar nos estrangeiros. Quanto mais subimos a colina que leva a Sultanahmet, menos turistas encontramos e mais divertida se torna a jornada.

A colina que leva a Sultanahmet é um imenso mercado onde andar se torna difícil.  Perco-me intencionalmente e encontro de tudo.

Da rua das especiarias ao Grande Bazar

A rua das especiarias é famosa pelas cores e aromas misturados e um dos principais pontos de atração turística. É difícil resistir à explosão dos sentidos, com as melhores lojas a exibirem as especiarias, os chás, as ervas aromáticas e os doces numa lógica escala de cores.

Quando olho colina acima, parece-me impossível caber mais gente. A rua é um vibrante corrupio de gente a subir e descer. De pequenos cafés, saem homens e rapazes em passo rápido. Seguram bandejas com chá para entregar e conseguem não entornar uma gota enquanto enfrentam a multidão.

Especiarias e frutos secos

Quanto mais se sobe a colina mais a multidão é local. Uma das coisas que este souk tem de mágico é não ser apenas um local a pensar nos dólares e nos euros. É evidente que também o é. Mas este é o ponto nevrálgico do comércio de Istambul, grande o suficiente para comportar várias mesquitas e esquadras da polícia no seu interior.

O Grande Bazar, no topo da colina, é absolutamente mágico. O edifício permite o comércio em qualquer condição meteorológica e funciona ininterruptamente desde a sua construção em 1455.

O Grande Bazar de Istambul

Transpor a porta do Grande Bazar é entrar num outro mundo, que pela primeira vez conheço na viagem entre o Cabo da Roca e Vladivostok.

É aqui que encontro Kalpakçilar Caddesi, a rua dos ourives, uma das 61 existentes no espaço coberto. É aqui também que um homem sentado na sua pequena loja me diz muito calmamente em francês, numa voz bem modelada e num tom de confidência:

— Anda cá que tenho uma coisa para te dizer…

Sempre muito calmo diz-me ter 60 anos e trabalhar há 50 no Grande Bazar.

— Só vendo coisas boas. Esta pulseira, por exemplo, pode ser muito boa para a tua mãe ou para a tua mulher.

Frutos secos
Açafrão iraniano no souk de Istambul
As especiarias são colocadas segundo uma lógica escala de cores
Temos especiarias, mas também caviar

Não sei porquê, mas raramente os vendedores se tornam insistentemente desagradáveis comigo. Respondo-lhes sempre com um sorriso e um “no, thank you”. Mas quando a abordagem é boa não resisto a parar. Digo logo que não posso ou não quero comprar nada, mas deixo que me tentem, num jogo sem vencidos, como o são todos os da sedução consentida.

A conversa flui, o homem começa por me tentar vender os colares e brincos, mas rápido percebe que não irei comprar. Então, muda o registo da conversa e pergunta-me de onde venho. A conversa, por estes lados, é uma forma de arte.

A um canto eleva-se um burburinho como se se tratasse de uma acesa discussão entre um grande grupo de homens. Afasto-me sensatamente, mas olho para os ourives e noto que não esboçam um qualquer gesto para defender a mercadoria.

O Grande Bazar de Istambul está em atividade desde 1455

O volume aumenta, mas dada a ausência de reação opto por me aproximar. Todos têm telefones na mão e apontam freneticamente uns para os outros. A suspeita é confirmada por um jovem que me lança um “stock market!” sem interromper a passada vigorosa: estão a comprar e a vender ações. Porque aqui de tudo se vende e tudo se compra.

É fácil perdermo-nos no souk porque fácil é reencontrarmos o caminho. Por ser numa das sete colinas de Istambul basta descer em direção ao Bósforo para nos voltarmos a encontrar na geografia da cidade.

Há de tudo no souk de Instambul

Opto por me perder intencionalmente. Saio do Grande Bazar e continuo a subir a colina, vou voltando à direita e à esquerda, consoante as montras que vou encontrando. Há ruas cobertas com panos para aplacar a inclemência do sol. E por todo o lado há um motivo para sorrir ou para nos maravilharmos com a diversidade.

Aqui, um expositor anuncia Viagra para os mais necessitados. Ali, o alfaiate mostra os fatos em pequenos manequins de barbas. Acolá, são montras que expõem espingardas de assalto, mas de pressão de ar.

E por todo o lado, a azáfama dos visitantes contrasta com a indolência dos comerciantes. Há quem se encoste à mercadoria, olhando para os passantes. Como estamos bem no cimo da colina, os comerciantes não abordam os potenciais clientes. Antes jogam um jogo de paciência.

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Jorge Montez: Nasceu e fez-se jornalista em Lisboa, mas quando o século ainda era outro decidiu mudar-se de armas e bagagens para Viana do Castelo. É repórter. Viveu três meses em Sarajevo quando os Balcãs estavam a aprender os primeiros passos da paz, ouviu o som mais íntimo da terra na erupção da Ilha do Fogo e passou cerca de um ano pelos caminhos do Oriente.
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