Portugal de Lés a Lés

 

A lenda da Boca do Inferno – Cascais

Boca do Inferno

Lá para as bandas de Cascais terá vivido em tempos, num grande castelo, um homem poderoso dotado de poderes de magia maléfica.




Habituado a tudo ter, decidiu um dia casar-se sem demora. Orgulhoso e possessivo, não lhe servia qualquer uma. Só o melhor concebia. Para isso, consultou a sua lâmina mágica que lhe indicou onde poderia encontrar a jóia de maior valor. E, imediatamente, mandou buscá-la.

Quando a moça foi levada à sua presença, o mágico ficou atónito com a sua beleza perfeita e notando a indiferença com que o olhava, logo o acometeram os mais violentos ciúmes.

Desejoso de a manter só para a sua vista invejosa e colérico por não conseguir o seu apreço, encerrou-a numa torre inacessível, perto do mar e para a guardar como um tesouro destacou um fiel cavaleiro, que nunca a tinha visto.

Isolados um do outro e de todos, a jovem e o guardião por ali ficaram, retidos naquele espaço, sem mais referência do que os barulhos da natureza e o ressoar dos seus pensamentos.

Nada de novo os perturbava, e o cavaleiro, nas inúmeras horas de ócio, divagava sobre a dama da torre, o seu aspeto e se estaria bem. Muito havia que especular acerca do assunto…

Tão fundo lhe chegavam estas questões que tomou finalmente a coragem para abrir a porta e subir ao alto edifício.

 

Aí se encararam, pela primeira vez, estupefactos, prisioneira e carcereiro, tão próximos e tão distantes.
A beleza e tristeza da jovem impressionaram o cavaleiro e ela, aturdida, quis saber porque lhe perturbavam a vida de solidão. Ele confessou ser seu guardião e, juntos, verificaram que a prisão era comum aos dois, que os afastara de todos.

Unidos pela tragédia, entre eles o amor logo nasceu, tão intenso e poderoso que combinaram fugir daquela prisão.

E na ânsia de fugir, tudo o mais esqueceram. O que mais importava era afastar-se para a vida. No cavalo branco do homem, galoparam seguindo os rochedos da costa, numa bela noite de luar.

Mas o feiticeiro ciumento que tudo via e sabia, encolerizado, sobre eles fez cair uma tempestade terrível. Tal era a fúria da intempérie, que os rochedos se abriram e engoliram cavalo e cavaleiros, despenhando-os no mar irascível.

E a tempestade logo acalmou como que consolada pela dádiva daquelas vidas.

Mas os rochedos não mais se fecharam e, depois disso, passaram a chamar-se Boca do Inferno.

Em dias de vento e tempestade, parecem querer contar a todos a infeliz história daqueles dois amantes.

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Isabel Cruz: Lisboeta, saltitou na vida adulta por aqui e por ali, até que “aterrou” no Minho numa aldeia com oceano, rio e montanha. Bióloga de formação, adora o mar e mergulhar em reinos de fantasia. Descobriu que gosta de fazer crónicas e colabora na promoção de uma Associação Musical local. Sempre a achar que há muito mais a descobrir.

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