Vamos passear por Elvas?

Do emblemático aqueduto da Amoreira à menos conhecida Igreja de Santa Maria da Alcáçova, da fortaleza abaluartada que faz da cidade Património Mundial aos museus, há muito que ver e contar naquela que ganhou o cognome de rainha da fronteira. Vamos passear por Elvas?




O carro pode ficar nos arrabaldes, antes de se subir a colina, ou mesmo no centro de Elvas, no estacionamento subterrâneo da Praça da República. Qualquer que seja a opção, quem tenha decidido passear por Elvas deve começar pelo centro, ir até ao posto de turismo ali mesmo na praça e, já munido de um mapa, avançar pela cidade dentro.

Estamos então na Praça da República. Se for segunda-feira aproveitemos para conhecer a feira de velharias e olhemos depois para o que nos rodeia. No topo da praça está a Sé que é manuelina mas recebeu várias modificações ao longo dos séculos. O mesmo aconteceu no edifício de onde saímos. Também é da época de D. Manuel I mas a traça caraterística já pouco se deixa ver. Subamos à varanda e daí apreciemos a praça de outro ângulo.

Na Sé Catedral o portal é hoje neo-clássico e apenas os portais laterais mantêm a traça manuelina. Também no seu interior temos uma mistura de estilos que não lhe tira, no entanto, harmonia. A capela-mor é de 1734 e foi o seu autor José Francisco de Abreu. Nela sobressaem os mármores de várias cores. Mas mesmo à entrada, numa capela do lado esquerdo, encontramos a Virgem de Guadalupe que é um dos sete objetos cuja história já contámos. Ainda na Sé visitemos o museu de Arte Sacra – onde sobressai o cálice oferecido por Felipe II de Espanha, I de Portugal, ao Bispo de Elvas quando o monarca aí residiu durante seis meses, e apreciemos ainda a bela Sala do Capítulo.

Ainda não saímos da Praça da República e já tanto se viu… continuemos a passear por Elvas e sigamos pela íngreme Rua Tenente Passos e Sousa em direção ao pequeno Largo do Dr. Santa Clara logo ali em cima onde há também muito para contar. Ao fim e ao cabo, estamos na rainha da fronteira.

Logo à primeira vista, deparamo-nos com uma muralha encimada por uma varanda. A muralha é dos poucos locais da primeira cerca islâmica que são visíveis e o palacete que lhe é colado foi remodelado para residência real. A varanda com arcos é romântica, tendo sido construída no século XIX pelo Dr. Santa Clara que dá nome ao local.

No centro do largo está o pelourinho que originalmente se encontrava fronteiro à Sé. Sendo do século XVI,  foi removido em 1872 e guardado. Partes perderam-se, mas as que sobreviveram foram utilizadas em 1940. Junto a este antigo símbolo de autoridade e exposição está a Igreja das Domínicas.

Este é um templo dedicado a Nossa Senhora da Consolação de planta octogonal pouco comum edificado no século XVI. Fazia parte do convento das freiras dominicanas demolido no século XIX. É fácil de dar com ele, porque o pórtico principal é renascentista. No seu interior, que sofreu remodelações no século XVII, destaque para a única pedra tumular portuguesa com motivos chineses.

O princípio de tudo

Sigamos para o castelo passando por baixo do arco da muralha em direção à Igreja de Santa Maria de Alcáçova, que tem como principal caraterística ter sido uma antiga mesquita que foi adotada para o culto cristão logo a seguir à conquista da cidade por D. Sancho II em 1229. Sigamos até ao princípio de tudo, à zona mais alta da urbe onde se ergue o castelo que adoptou a primeira fortificação muçulmana.

Aqui D. Dinis assinou a paz com o seu filho D. Afonso e os reis D. Fernando e D. Jão I de Castela puseram a sua assinatura no documento que acabava com as hostilidades entre os dois reinos. O castelo foi o local escolhido para várias trocas de princesas e até de casamentos reais. Depois de construída a fortaleza abaluartada perdeu importância militar e na segunda metade do século XIX estava votado ao abandono. Em 1906 tornou-se no primeiro Monumento Nacional português.

Aqui podemos fazer uma pausa na esplanada do café que há dentro de muralhas e, cá fora, visitar a olaria de Luís Pedras onde nascem as famosas roncas de Elvas.

Como não temos outra hipótese, voltemos a descer pela pitoresca Rua das Beatas. É agora tempo de olharmos para a história militar da cidade e irmos encontrando os vestígios da Praça Forte que chegou a albergar dezenas de milhares de soldados.

A cidade-quartel

A fortaleza tem 30 hectares e apenas 3 portas
Porta da Conceição

Chave do Reino de Portugal e rainha da fronteira mais antiga da Europa, a cidade foi fundamental em vários momentos da história do país. É por isso que passear por Elvas nos leva sempre ao encontro da história militar. Seja nas Guerras Fernandinas do século XIV ou mais tarde na Guerra da Restauração (1640/1668), Elvas era a principal praça forte portuguesa numa altura em que a população era obrigada a albergar a soldadesca. Assim foi até à construção da muralha abaluartada e dos aquartelamentos para artilharia, infantaria e cavalaria.

Com a modernização do exército, nascem um pouco por toda a cidade edifícios militares. Temos os quartéis, o Conselho de Guerra, a Casa das Barcas utilizadas para a travessia dos rios, o Paiol e o Trem, onde eram feitas armas e munições. São edifícios que hoje têm outros fins e que vão aparecendo um pouco por toda a cidade. Atravessêmo-la em direção à muralha abaluartada e recuemos de novo no tempo para apreciarmos aquele que é um dos mais impressionantes aquedutos portugueses, o da Amoreira.

O aqueduto da Amoreira

Localizada no alto de uma colina, a cidade de Elvas sempre se debateu com problemas de abastecimento de água. No século XV, os cerca de 5.000 habitantes continuavam a servir-se do antigo Poço d’Alcalá e pedem ao rei D. Manuel I que resolva o problema.

Ciente da importância estratégica de a cidade poder resistir a cercos, o monarca anui e lança um imposto Real d’Água na cidade sobre bens de consumo. Com o dinheiro assim conseguido, encarrega o arquiteto-régio mor Francisco de Arruda de desenhar o aqueduto.

A imensidão da obra faz e o pouco dinheiro conseguido com o imposto faz com que o aqueduto pouco avance até 1537, ano em que são impostas multas a quem falte às procissões e são feitos vários empréstimos para que a obra enfim entre em velocidade de cruzeiro. O aqueduto apenas ficou concluído em 1622, ano em que pela primeira vez a água começou a correr na Fonte da Misericórdia.

O aqueduto da Amoreira é hoje um dos traços distintivos da cidade e os seus arcos chegam a atingir os 30 metros de altura mesmo à entrada da cidade e um dos pontos de passagem obrigatórios para quem ande a passear por Elvas.

O aqueduto chega a atingir os 30 metros de altura
Aqueduto da Amoreira

E já que aqui estamos e que passear por Elvas abre o apetite, sigamos em direção ao Santuário do Sr. Jesus da Piedade e antes de entrar no templo franquemos as portas do El Cristo para comermos peixe e marisco de qualidade tal que parece estarmos no litoral.

Já com o estômago aconchegado, conheçamos o Santuário do Senhor Jesus da Piedade, onde o barroco é rei, e conheçamos a história e a lenda tal como nos são contadas pelo historiador Rui Jesuino e entremos no seu interior para descobrir o impressionante Museu dos Ex-Votos que aqui existe.

Já que estamos no exterior das muralhas, aproveitemos para saber que o primeiro edifício civil a ser construído fora da fortificação foi a Pousada de Elvas, em 1943. Nesta que foi a primeira Pousada de Portugal nasceu aquele que é o prato emblemático da cidade raiana, o Bacalhau Dourado. Tudo aconteceu porque em 1947 uma delegação do governo português aqui se reuniu com delegados do executivo espanhol. Como o encontro era secreto, a Pousada não foi avisada e na cozinha não havia nada preparado. Com bacalhau, ovos, batatas e azeite a cozinheira desenrascou o jantar e criou um prato de fazer crescer água na boa.

Passear por Elvas é também ver museus

Regressemos dentro de muralhas para conhecer os três museus da cidade. Mesmo ao pé da Torre Fernandina encontramos o excelente Museu de Arte Contemporânea de Elvas, que alberga a coleção de António Cachola. Neste espaço são apresentadas mostras feitas a partir do acervo do colecionador. Pintura, escultura, desenho, gravura, instalação, vídeo e fotografia de jovens artistas portugueses a partir dos anos 80 do século passado são mostrados neste museu instalado num edifício do século XVIII.

Ainda na malha urbana, o Museu Municipal de Fotografia é dedicado à coleção de máquinas de João Carpinteiro, onde encontramos, entre muitos outros motivos de interesse, o protótipo da primeira máquina fotográfica portátil do mundo.

Num passeio por Elvas, os passos levam-nos sempre de regresso à muralha abaluartada. Aproveitemos e entremos no Museu Militar que ocupa os antigos Quartéis do Casarão e onde podemos ainda apreciar os claustros do Convento de São Domingos. No museu podemos perceber como funciona in-loco a fortaleza abaluartada de Elvas e conhecer a história do Serviço de Saúde militar, ver viaturas ou os hipomóveis do exército.

O dia já se faz longo, mas não acabemos de passear por Elvas de barriga vazia. Se preferirmos comida tradicional alentejana podemos ir à Adega Regional, mas aconselhamos o Acontece, um moderno restaurante que oferece bom serviço e outros pratos, como o Fondue e o bife na Pedra.

 

 

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