A lenda do pescador Ramiro e da Ria de Aveiro – Ílhavo

Lenda da Ria de Aveiro
Ilustração de Alexandra Faria de Almeida

Vivia, em tempos, junto à Ria de Aveiro, um jovem pescador de nome Ramiro. Órfão de mãe e pai, trabalhava na faina, juntando dia a dia o pouco que lhe daria para sobreviver. Vivia então com sua madrinha, solteirona de bom coração, mas de aspeto pouco agradável à vista.

Só, no barco onde pescava, ouviu um dia, uma linda voz que cantava.

Primeiro, inebriou-se. Depois, enamorou-se…

Aproximou-se do local, deparando-se-lhe uma linda jovem que se banhava nas águas. Estava nua, mas não se assustou ao ver Ramiro e estendeu-lhe a mão sorrindo.

Era de uma beleza perfeita, em formas e em cores e o pescador logo lhe declarou que já a amava e queria casar com ela. A rapariga sorriu, dizendo-lhe que muito gostaria de desposar jovem tão forte e belo, mas que isso seria impossível, pois era uma sereia. E, estendendo-se na água, ali lhe mostrou o que ele antes não pudera ver, uma cauda de sereia com lindas escamas que brilhavam cintilantes.

Revelou-se ela então ser filha do rei dos Mares, estando destinada para esposa de um tritão mau e irrascível. E começou a chorar…




As lágrimas rodeavam-na como pérolas luminosas. Ramiro, perturbado, prometeu-lhe construir uma casa, metade em terra, metade na ria, onde poderiam ser felizes.

Mas a bela sereia lamentava-se por medo ao tritão, dizendo que só se pudesse ser uma mulher de verdade o desposaria. Lastimosa por isso ser impossível, mergulhou e desapareceu.

Ramiro bem lançou as suas redes e procurou, mas nada. E dia após dia, definhava de amor o pobre enamorado, causando grande aflição a sua madrinha, a quem tinha contado o que se passara.

A boa senhora, vendo que o final do moço não estava longe, aconselhou-o visitar pela noitinha uma velha que ali perto vivia. A sua sabedoria era conhecida de todos e os poderes que tinha faziam-na temida mas respeitada pela vizinhança.

E Ramiro lá foi tremendo: de início de ansiedade e depois, ao ver o seu aspeto e o interior da sua casa, de medo profundo.

A velha nem o deixou falar, alegando que sabia ao que vinha e que poderia ajudá-lo, mas que tudo teria de ser feito como mandado, pois qualquer erro faria com que nunca mais pudesse ver a sua amada. E perante Ramiro aturdido, enumerou e fê-lo repetir várias vezes os passos que teria que seguir para casar com a linda sereia feita mulher.

Primeiro, havia que construir uma casa de madeira nas dunas situadas no local designado por Costa Nova. De seguida, deveria pintá-la de riscas de cor viva, alternando com branco para afastar o mau olhado. E então, seria altura do passo mais delicado do processo, que seria pescar a Lua Cheia.

Pescar a Lua Cheia? Nem nos mais fantasiosos sonhos sabia Ramiro ser isso possível.

Há que pescar a Lua Cheia, insistia a velha ou melhor, capturar o seu reflexo na água com a rede da faina e levá-lo para dentro da casa feita, onde a sereia se tornaria mulher.

Mas, atenção! Tudo deveria ser feito sem qualquer ruído, de modo a que a Lua não se apercebesse. Mais ainda, ninguém poderia saber do processo até o objetivo ser alcançado.

Saiu o jovem da casa da bruxa, cheio de esperança e Ramiro pescador, tornou-se Ramiro construtor.

Num trimestre, a casa ficou feita e pintada e para o esconder da grande Lua, a proa do seu barco foi elevada em forma de pequeno crescente.

Tudo preparado, em bela e límpida noite de Lua Cheia, Ramiro lança a rede silenciosamente sobre o seu reflexo e sem qualquer barulho, captura o globo brilhante. Navegou quietamente até à casa que construíra e quando ia lançá-la para dentro, pisa uma ave que foge, clamando a sua indignação. Imediatamente, o globo desaparece e tudo termina.

Ramiro, destroçado, chorou de dia e de noite e durante muito tempo pelo seu amor perdido. Tantas lágrimas chorou que encheu umas covas que por ali existiam. O calor do sol evaporou a água, só ficando o sal.

E assim, desde então que, por amor de Ramiro a uma sereia, a Ria de Aveiro se modificou.

Tem as suas famosas salinas, fruto das lágrimas choradas.

Tem as casas da Costa Nova, erigidas à semelhança da construída por Ramiro.

E tem os seus moliceiros, tão característicos da Ria que continuam de proa erguida, esconderijo fracassado do pobre amante.


Ilsutração da lenda de Alexandra Faria de Almeida
Alexandra Faria de Almeida | Avedouda

Sou  Alexandra, citadina de Lisboa, mas agora rendida ao campo. Com formação em Arquitectura de Interiores e Mobiliário e mestrado em Design de Informação e Gráfico, fiz diversos cursos como gravura, fotografia, papier maché e pintura.

Cresci entre viagens e vivi dois anos em Macau e outros dois em Inglaterra.

Recebo a cor e o cheiro dos lugares por onde passo. Daí crio, com muito amor, as peças para a minha marca Avedouda®.

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